Com tristeza eu vejo o fim da coluna de xadrez semanal de um dos mais importantes jornais do mundo, o The New York Times (TNYT). Ao pé da coluna publicada em 12/10/2014 pode-se ler algo como “Esta é a última coluna de xadrez a aparecer no TNYT”. Ontem, confirmei, no espaço antes recheado de xadrez, apenas o obtuário imaginário: ‘Aqui jaz a coluna de xadrez do TNYT. ☼16-4-1952 † 12-10-2014‘.
Um jornal importante como esse dar fim à sua coluna é um péssimo e perigoso exemplo a outros periódicos menores. Mas será o sinal dos tempos?
Acho que minha geração foi a última que ainda teve como uma das poucas fontes de informação sobre o xadrez aquelas desejadas e coleciondas tiras, ou quadros, que se publicavam nos principais jornais das principais cidades do Brasil e do mundo. Lembro que o Jornal O POVO de Fortaleza trazia uma coluna aos domingos, no incício da década de 1990, e foi nela que pela primeira vez aprendi sobre nomes do (então) presente: Kasparov, Karpov, Anand, Kamsky, Kramnik… Além, é claro, dos nomes dos melhores jogadores de minha cidade, ao observar os resultados de torneios locais.
Como bem foi falado no chessbase.com antes da internet, esperávamos semanas por resultados de eventos internacionais, partidas decisivas, divulgação do ranking mundial etc. Aqueles poucos centímetros quadrados semanais chegavam a ter uma considerável densidade de informação, que eram avidamente absorvidos, deixando uma enorme vontade de que chegasse logo a próxima semana.
É verdade que o formato não se presta mais a esse antigo propósito. Estão aí as excelentes postagens diárias de blogs como o ChessBase.com, ChessVibes.com, The Susan Polgar Chess Blog, The Week on Chess, onde o xadrez internacional é esmiuçado por grandes mestres. Sem falar nos inúmeros blogs nacionais, com ênfase muitas vezes no xadrez local (estadual, municipal, do bairro, da escola). Mas acho que o xadrez ainda merece um espaço semanal nas páginas de nossos jornais. Não se deve privar o leitor, mesmo um não enxadrista, do prazer, ou pelo menos da surpresa, de encontrar no meio de palavras cruzadas, sudoku e tirinhas diversas, aquelas figuras sobre o tabuleiro, formando um problema de xadrez.
Teria George Orwell escrito sobre xadrez em sua obra prima 1984 não fosse a inspiração que encontrava ao resolver problemas de xadrez que vinham nos jornais de sua época?
As colunas de xadrez dos jornais ainda são o único elo que liga multidões de não aficcionados a um pouco da magia do xadrez. Elas são quase um elemento arquetípico que ajuda a manter nosso jogo como parte da nossa cultura popular, e não somente um nicho reservado aos seus ferrenhos praticantes. Não duvido que, muitas vezes, aquelas poucas palavras sobre xadrez, aquele parco diagrama com um problema, foram suficientes para conquistar mais um enxadrista.
Mesmo o ChessBase.com parece crer num retorno da coluna do TNYT, defendendo que, para tal, deve ser contratado um grande mestre que também seja bom com as palavras, que tenha histórias e casos para contar, em primeira mão, detalhes que só quem jogou e viveu a realidade dos torneios pode contar. Alguém com a cultura enxadrística necessária para propor boas partidas ou bons problemas ao grande público.
Acho que a receita acima é válida para os grandes jornais, como TNYT, Le Monde, Folha de São Paulo, que teriam o cacife e o alcance necessários para fazer valer o investimento. Mas, para jornais menores, acredito que uma coluna deve falar assuntos locais, coisas que só quem está naquela cidade sabe, ou tem interesse em saber. O autor não precisa ser um mestre como jogador, mas alguém que ame o jogo, goste de escrever sobre ele, tenha boa cultura a respeito do jogo, boas fontes, seja conhecido e prezado pela comunidade enxadrística local. Um bom exemplo do que falo é a coluna semanal do jornal Tribuna do Norte, aqui de Natal-RN, assinada pelo competente Valério Andrade.
A marcha infalível do tempo transforma cada vez mais rapidamente as coisas queridas em passado, e parece ter chegado a hora das colunas de xadrez. Mas eu continuarei comprando apenas jornais que publiquem em suas páginas ao menos um mísero diagrama, brancas jogam e ganham…