Pensamento acelerado é pensamento?

Mas, vocês sabem como analisar variantes?’ Eu perguntei aos meus ouvintes e, sem dar-lhes tempo de responder, eu continuei. ‘Vou mostrar-lhes como analisar variantes e se por acaso eu estiver errado, então me interrompam. Vamos supor que numa dada posição em sua partida, você precise escolher entre dois lances Td1 ou Cg5. Qual deles você deve jogar? Você senta confortavelmente eu sua cadeira e inicia a análise dizendo silenciosamente para si os lances possíveis: ‘Bem, eu poderia jogar Td1 e ele provavelmente jogará … Bb7, ou poderá tomar meu peão da coluna a, que agora estará desprotegido. O que depois? Esse nova posição me agrada?’. Você segue uma jogada além em sua análise e então faz uma cara de desagrado – o lance de torre não parece bom. Então, você passa ao lance de cavalo. ‘E se eu jogar Cg5? Ele pode expulsar o cavalo com … h6, eu jogo Ce4, ele captura o cavalo com o Bispo. Eu recapturo, e ele ataca minha dama com sua torre. Isso não parece muito bom… então o lance de cavalo não é tão bom. Vamos checar o lance de torre de novo. Se ele joga … Bb7 eu posso responder com f3, mas o que fazer se ele capturar meu peão de a? O que posso fazer em seguida? Não, o lance de torre não é bom, eu tenho que checar o lance de cavalo novamente. Então, Cg5 h6; Ce4 B×e4; D×e4 Td4. Não, não é bom! Eu não devo mover o cavalo. Tente o lance de torre mais uma vez. Td1 D×a2. Neste ponto, você olha para o relógio. ‘Meu Deus, já se passaram 30 minutos pensando se movo a torre ou o cavalo’. Se você continuar assim, acabará nos apuros de tempo. Subitamente você se depara com uma ideia feliz – por que mover a torre ou o cavalo? ‘Que tal Bb1?’. E, sem análise alguma, você move o bispo, assim mesmo, praticamente sem nenhuma consideração.

Alexander Kotov (1971) – Think Like a Grandmaster (tradução livre)


A passagem acima inicia um dos maiores clássicos da literatura de xadrez no mundo, Pense como um Grande Mestre (GM), escrito pelo GM soviético Alexander Kotov nos anos 1970. Nesse livro, ele apresentou ao enxadrista comum o conceito (e a técnica) de lance candidato e árvore de variantes. A audiência de Kotov, ao final da passagem acima, aplaudiu o mestre efusivamente, tamanha a exatidão com que ele descreveu o pensamento do jogador comum (inclusive o dele mesmo antes de alcançar a maestria).

Em sua descrição do pensamento do jogador comum durante uma partida, Kotov já antecipava o problema da falta de concentração e profundidade de raciocínio, algo que foi se acentuando com o tempo e que hoje acomete grande parte da população, enxadristas ou não. São diversas alterações que estão associadas à sobrecarga de informações, falta de controle da ansiedade, acúmulo de atividades. Algumas dessas alterações tem sido, inclusive, tratadas como distúrbios.

Um desses distúrbios é conhecido como Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA), conforme nomeada pelo psiquiatra brasileiro Augusto Cury. Esta síndrome acomete principalmente pessoas submetidas a um trabalho intelectual intenso, que precisam de muita concentração, sujeitas à entrega de resultados sob pressão (justamente como numa partida ou torneio de xadrez). A SPA é um transtorno na organização e controle do pensamento causado pelo ritmo acelerado de vida que se tem atualmente, com exposição da mente a uma quantidade exagerada de estímulos e informações, de forma que a atenção fica “chaveando” entre esses estímulos sem conseguir o foco e a permanência necessária para resolver propriamente qualquer questão antes de passar à próxima.

Os efeitos da SPA sobre o organismo são diversos e nefastos: mente inquieta, ansiedade, falta de sono, sofrimento por antecipação (‘e se ele tomar meu peão da coluna a?’), reagir sem refletir propriamente (‘Por que não Bb1?’),cansaço físico intenso, queda na resiliência e redução da capacidade de se colocar na posição do outro (o que importantíssimo no xadrez!).

O enxadrista pode sofrer com alguns sintomas específicos. Em geral, ele não usa mais tabuleiro para treinar, logicamente, pois o smartphone, o tablete o computador estão aí, à mão. Então, ele começa a passar uma partida, num aplicativo qualquer, para numa posição e tenta pensar numa variante (como na passagem do livro de Kotov), passados alguns momentos… ‘o que será que o computador diz desta posição?’ … lá se vai o estudo por conta própria. A longo prazo, ele perde não só o hábito de analisar, como também a confiança em seu julgamento.

Os próprios mestres andam sofrendo com isso. Tem a história recente de um GM que estudou com o computador uma longa variante de abertura para usar num torneio, memorizou tudo. Na partida, tanto ele como o adversário (outro GM) jogaram super-rápido, para deixar mais tempo para pensar na hora decisiva da partida. Resultado: o primeiro GM confundiu uma jogada, na ânsia de jogar a linha memorizada, acabou errando e ficando em posição perdida. Algo facilmente evitável para um jogador daquele nível se ele simplesmente parasse alguns instantes.
Mestres, mesmo campeões mundiais, podem ser presas dos efeitos nocivos do pensamento acelerado. (Fonte: Google, Fischer 1972)
Para reduzir os sintomas, os especialistas tem recomendado medidas bem simples, que podem ser adotadas por enxadristas e não enxadristas, e que consistem em voltarmos aos hábitos de alguns anos atrás: passar um bom tempo offline (vale ler livros em papel), praticar atividades lúdicas (partidas com peças, tabuleiro, relógio e adversários reais), exercitar o corpo (ir caminhando ou pedalando ao trabalho ou torneio), estar próximo de pessoas queridas (o que inclui encontrar os colegas enxadristas num clube) e meditar.

O tabuleiro real é ponto de encontro para amizades e conversas (acervo do autor – amigos enxadristas do RN)
Em especial, a própria prática do xadrez (com tabuleiro e peças reais) com amigos é uma excelente atividade lúdica para não enxadristas combaterem os sintomas da SPA.

Diz a antiga sabedoria popular que tudo demais é veneno, então, por que não reduzir um pouco o ritmo, o volume de tarefas e informações, os papos simultâneos em aplicativos de mensagem, parar de comer olhando para TV ou smartphone, ouvir um pouco o som do silêncio? Ali no fundo, por baixo de toda a confusão, você encontrará o seu melhor xadrez, ou futebol, ou karatê… em suma, encontrará a melhor versão de si mesmo.


Fontes de consulta:

Xadrez e Abnegação

O tema de hoje é abnegação.
“Como assim!? Não seria, combinação?”
Não, abnegação mesmo, mas aplicada ao Xadrez.
Nos muitos anos que estou envolvido com o Xadrez, desde a época dos torneios escolares, Xadrez universitário, de forma mais conceitual (nas pausas para pensar na vida profissional), no retorno em 2010 e, mesmo agora, neste novo momento conceitual, eu presenciei muitos casos de abnegação.
É abnegado o jogador que vai sublimando, derrota após derrota, seu amor pelo jogo. Abnegado o candidato a Mestre, que abre mão de carreiras mais rentáveis, pelo amor ao jogo. Abnegado o árbitro, muitas vezes abrindo mão do convívio familiar em finais de semana, para dar aos outros enxadristas o prazer de disputar uma competição.
Eu conheci muitos abnegados, mas hoje tenho algo recente a falar de alguns: todos da Academia Damasceno de Xadrez (ADX), em especial na figura do patrono Sr. Alécio Damasceno,  e do Prof. Ari Maia. Foram pessoas que muito me motivaram nos caminhos do jogo, cada um à sua maneira, numa determinada época.
O Prof. Ari Maia, já conhecido em todo o Brasil pelo seu trabalho voluntário pelo crescimento da prática do Xadrez, foi meu primeiro professor do jogo, e hoje está a frente, entre outras ações, da Liga Brasileira de Xadrez (LBX). Ele acaba de lançar e disponibilizar gratuitamente na internet um e-book com as Leis do Xadrez  Comentadas. A visão, acertada, de Ari Maia é que popularizar as regras e formatos dos torneios é um catalisador natural para o crescimento do número de praticantes do Xadrez. Gostaria de parabenizar meu antigo professor pela iniciativa.
Já a ADX, eu conheci quando fui morar em Natal (RN). Fiquei impressionado com a Academia. Tive logo a grata satisfação de lembrar que havia enfrentado (e perdido para) o Sr. Alécio no famoso Torneio Circuito do Sol, realizado em Fortaleza em 1994. Ele ainda conserva a súmula da partida. Ali, quiçá no melhor salão de jogos do Brasil, joguei muitos torneios na minha mais recente tentativa de retorno ao Xadrez de competição, e foram experiências memoráveis. Lá na ADX eu acho que se segue à risca o antigo lema do CXEB: “Leva o Xadrez, traz o amigo”.
Átila, Lênia, este autor e Alécio Damasceno (acervo pessoal)
Como estou partindo de Natal, fui recentemente me despedir e deixar uma pequena lembrança em sinal de amizade e gratidão àquela família que adotou o Xadrez como missão e estilo de vida.
Mesmo agora, numa posição mais afastada, continuo observando e saudando esses abnegados heróis do jogo. Pessoas assim não movem somente peças frias nos tabuleiros, elas movem o Xadrez pelo Mundo.Compartilhe: http://bit.ly/XadrezAbnegado

ADX encerra atividades de 2013 com Torneio de Confraternização

A querida Academia Damasceno de Xadrez realizou ontem um Torneio de Confraternização. Não vou aqui falar das partidas ou do resultado final, pois o importante é o clima de camaradagem e amor ao Xadrez que verificamos naquela casa, coisa comum a todos os seus mais assíduos frequentadores.
Parabéns á ADX pelas atividades realizadas em 2013. Foi um grande ano para a Academia! Esperamos 2014 com a mesma vontade de jogar umas partidas e colocar o papo em dia!
Participantes do Torneio de Confraternização da ADX (21/12/2013). Foto da ADX.

ADX e LBX farão grande evento em Natal neste FDS!


Nos próximos dias 14 e 15, a ADX e LBX promovem o Torneio Aberto de Xadrez Rápido da Liga Brasileira de Xadrez, que será o segundo evento da LBX no estado do RN, o primeiro na cidade de Natal.

O torneio será realizado na cadência rápida de 20min/KO em 9 rodadas e distribuirá R$ 4000,00 em prêmios (sendo R$ 900 para o campeão) que vão até o décimo colocado geral e melhores nas diversas categorias.

A organização é da ADX (toda a família Damasceno) juntamente com o MF Roberto Andrade que é um dos diretores da LBX no RN. O árbitro principal será o AF Ari Maia.

CRONOGRAMA:

  • Congresso técnico: 14 horas do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 1ª Rodada: 14h30 do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 2ª Rodada: 15h30 do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 3ª Rodada: 16h30 do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 4ª Rodada: 18h30 do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 5ª Rodada: 19h30 do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 6ª Rodada: 20h30 do dia 14 de dezembro de 2013 
  • 7ª Rodada: 09h30 do dia 15 de dezembro de 2013 
  • 8ª Rodada: 10h30 do dia 15 de dezembro de 2013 
  • 9ª Rodada: 11h30 do dia 15 de dezembro de 2013 
  • Encerramento e premiação: 12h30 do dia 15 de dezembro de 2013
INSCRIÇÕES:
  • Mulheres, menores de 18 anos e maiores de 60 anos, R$ 20,00.
  • Demais jogadores: R$ 40,00.
  • OBS.: No dia do torneio as inscrições serão majoradas para R$ 30,00 e R$ 60,00, respectivamente, de acordo com as faixas de inscrição citadas anteriormente e estarão sujeitas à disponibilidade de lugares. 
LOCAL:

O torneio será realizado na Associação Residencial Areia Dourada – ARAD, na Rua Alfredo Dias Figueiredo, Natal, Rio Grande do Norte.
(melhor caminho é ir por Ponta Negra e pegar a rotatória sentido Estádio do ABC, depois pegar à direita como se fosse para Nova Parnamirim)

AVISOS IMPORTANTES:

1. Todos os jogadores deverão ter peças e relógios em perfeito estado de funcionamento. Partidas não jogadas por falta de material serão computadas como “- x -” ou seja, perda por falta de ambos os jogadores. 
2. A tolerância para cada partida será de 15 minutos. 

3. Os jogadores poderão entrar no torneio até o início da 3ª rodada no torneio.

Regulamento completo AQUI