Um lance no Maracanã

Catedral do futebol brasileiro (Google)
Eu não sou um fã de futebol, sequer tenho um time do coração. Até mesmo a Seleção, que costuma atrair-me o olhar a cada quatro anos, tem caído em esquecimento.


Inúmeras vezes eu sentei em frente ao aparelho de TV para tentar seguir uma partida do início ao fim, mas, em pouco tempo, o verde do fundo da imagem me faz cair num sono fortuito e reparador.


Há, porém, um fato que me deixa encucado: eu adoro ler crônicas sobre futebol.


Não sei se é pela qualidade dos cronistas, gente como Nelson Rodrigues, Carlos Drummond de Andrade e Luís Fernando Veríssimo, para falar só dos muito famosos escritores fãs do futebol. Tem também alguns que foram artistas no campo e agora escrevem sobre o jogo, o mais notório deles é Tostão.


A crônica e o futebol são artes que o brasileiro tomou para si como se fossem bens de nascença, de forma que nosso país se tornou referência nas duas. Assim, crônicas futebolísticas são como princesas reais oriundas de duas importantes majestades da expressividade nacional.


Contudo, não creio que seja possível escrever sobre o jogo de forma a torná-lo interessante e acessível, até para aqueles como eu, se não estiver ali presente uma boa dose de paixão. A paixão pelo jogo é o filtro que transforma chutes, dribles, escanteios e gols em esperança, alegria, frustração, raiva e esperança novamente. Parece até que futebol, quando transformado em palavras, assume o que tem de mais humano e mais belo e passa a ser de interesse universal.


Uma vez somente, eu senti um pouco desta paixão pelo futebol. Foi num domingo, dia de Missa e futebol. Aceitei o convite para ver uma partida Flamengo x Fluminense realizada num Maracanã lotado (seria minha primeira vez naquele mítico estádio, o que pode ter contribuído para o estado geral das coisas). Como um ateu que adentra uma catedral, sentei e fiquei observando a partida, aparentemente muito mais sem graça que na TV, já que não tem os comentários, nem replay. Foi, então, que aconteceram os gols, e tudo mudou.


A numerosa torcida do Flamengo, com a vantagem de sua equipe, começou um canto e um movimento que se tornou vibratório, ultrapassou o da torcida contrária e foi chegando a todos os presentes, inclusive a mim. Alguns ali estavam tendo pela primeira vez em dias o sentimento de unidade com outros seres humanos, a primeira felicidade do mês, recebiam de volta o primeiro olhar humano de compreensão do colega de brasão. Foi aí que percebi o valor do espetáculo.


Eu não lembro do placar, nem dos artilheiros, mas lembro de ter sido, por um momento, levado a sentir o mesmo que aqueles torcedores sentiam, e compreendi. A vitória do time do coração era só um gatilho para uma felicidade intensa, passageira como qualquer felicidade, mas que reabastecia o ânimo na espera pela próxima partida; até lá, a vida continuaria a ser um mero intervalo.

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