Este texto foi escrito numa máquina de escrever portátil, uma Olivetti Leterra 22. Foi presente de um amigo que, ao saber da minha vontade de ser escritor, apressou-se em dar melhor uso à relíquia que mantinha em casa sem serventia.
O simbolismo do presente vinha ao encontro de um comentário que fiz sobre o Finding Forrester. O filme conta a história de um escritor recluso que resolve aconselhar um jovem aspirante a escritor. Um dos artifícios é o uso das antiquadas máquinas mecânicas, muito úteis para dar ritmo à escrita, de forma que as palavras são transferidas da mente ao papel por mera necessidade rítmica.
Apesar de não ser comparável à complexidade de um computador, é impressionante ver em funcionamento os diversos mecanismos da Lettera. É uma máquina velha, portanto já tem seus vícios, como o acento agudo que não volta após ser solicitado e demanda uma intervenção manual (mais manual que de costume).A complexidade destas máquinas é visível a todos, ainda mais na minha que pede a retirada da cobertura para ter acesso às hastes. Já a complexa “mecânica” dos computadores fica escondida, podemos apenas imaginar.
O ritmo realmente ajuda, não se quer parar de ouvir os golpes das hastes no papel, dão a sensação de progresso, de evolução. O suor brota da testa, sinal que o esforço não é só mental; isso pode ser mais um atrativo para as letras, nesta época em que o jargão “menos é mais” só é aceito quando o assunto é peso corporal.
Conforme a tinta vai clareando, novamente a mão larga as teclas, desta vez para mudar a posição da fita bicolor. Outra preocupação que jamais ocorre ao escritor moderno, que no máximo pensará depois se deve imprimir o texto e se há tinta na impressora.
A tarefa de encher uma página A4 também fica mais árdua, pois não se alteram a fonte nem o tamanho dela, nem convém alterar o espaçamento padrão entre as linhas dado pela charmosa alavanca do lado esquerdo, sempre solicitada após o “trimmm”.
Nos tempos atuais, porém, é preciso achar um meio de portar o texto finalizado desta folha de papel única e inédita para um arquivo digital. Enquanto bato as teclas, penso em duas formas, uma rápida e preguiçosa (o scanner) e outra lenta, porém edificante (redigitar em um editor de texto); esta última já será uma ótima oportunidade de revisar o escrito, possivelmente após uma pausa para uma xícara de café.
Fico feliz quando encontro ocasião de usar minha Lettera, é uma forma voltar ao passado, de reconhecer o valor do que foi feito por aqueles que vieram antes de nós, cheios de engenhosidade e carinho pelo ofício. Só assim para descobrir que muitas das obras que nos foram legadas foram fruto não somente de talento e inspiração, também custaram muito suor (acabo de descobrir que minha máquina de escrever não tem ponto de exclamação).
Compartilhe: http://bit.ly/MinhaLettera22
Muito bom Rew. Depois vou assistir o filme.